Vida que 'quase' deu errado tem no Jiu-jítsu um novo sentido (Foto: arquivo pessoal)
Superação, força de vontade e disciplina, qualidades próprias àqueles
que alçam voos buscando sonhos e metas de vida. O lutador de jiu-jítsu Erberth Santos, o
'Dino', 19, saiu do inferno particular (roubos, prisões e tiros de borracha, entre outros) para despontar no mundo
da arte suave como uma das principais revelações dos últimos anos.
Dino possui
um currículo que o credencia no cenário nacional e internacional da arte suave.
De 2006 até 2013 foi três vezes campeão mundial pela Confederação Brasileira de
Jiu-jítsu Esportivo - CBJJE (peso a absoluto); vice campeão mundial pela International Brazilian Jiu-jítsu Federation - IBJJF; quatro vezes campeão brasileiro
pela CBJJE; duas vezes campeão brasileiro pela CBJJ; campeão do Rio Open (peso
e absoluto); bicampeão panamericano de Jiu-jítsu pela CBJJE; duas vezes campeão
do São Paulo Open de Jiu-jítsu pela CBJJE; Campeão do Abu Dhabi 2011 e quatro
vezes campeão da seletiva de Abu Dhabi.
O começo
Erberth Santos Mesquita apareceu para o jiu-jítsu aos nove anos, quando morava no bairro Calungá, localizado na cidade de Boa Vista (RR). Começou os treinos na Acas (Associação de Cabos e Soldados), em um projeto social da Associação PF Team, coordenada pelo professor Pedrão Freitas, que ensina o jiu-jítsu em diversos bairros da capital de Roraima.
O lutador foi 1º lugar no Rio Open Internacional de Jiu-jítsu 2013 (Foto:arquivo pessoal)
- Conheci o jiu-jítsu por meio de meu ex-cunhado, o Fabiano 'Jacarezinho'
[lutador de MMA]. As vezes eu ia acompanhar minha irmã e com isso ficava lá
vendo os treinos dele. No começo observava o pessoal treinando e não
via muita graça. Até que um dia faltou uma pessoa para fechar as duplas no
treino, daí tinha um kimono lá sobrando e então eu fui ajudar uma menina a
fazer posições. Tudo começou aí - relembra.
Eram tempos difíceis, vindo de uma
família humilde, o desejo de treinar esbarrava na falta de estrutura financeira para
continuar na arte suave. Sem apoio para comprar kimonos e sem dinheiro para
se inscrever em competições, ele mesmo corria atrás das inscrições.
- Capinava um quintal ali,
cortava uma árvore lá e assim dava de juntar a grana pra lutar o campeonato do
fim de semana.
Dos
nove aos quinze anos de idade, Erberth Santos treinou jiu-jítsu em
Roraima, tempos de intensa dedicação ao jiu-jítsu, mas
sem o foco necessário. Junto com o envolvimento na arte marcial o
lutador também se envolveu com o mundo do crime. Um futuro antes
promissor caminhava para uma
triste realidade.
- Me envolvi com amizades erradas. Eu tinha duas opções,ou continuava no
mundo do crime, que com certeza me levaria a morte ou prisão, ou mudaria de
vida. A mudança através do esporte era o melhor caminho.
O mundo do crime: roubo, polícia e
prisão
Maus bocados. Santos já treinava jiu-jítsu há três meses e nesse tempo foi preso cinco vezes, sendo duas apenas em uma semana. O garoto caia na armadilha da vida fácil e estava levando familiares para seu abismo.
De 2006 até 2013 o lutador 'papou' vários títulos, agora alça voos rumo aos Estados Unidos(Foto: Divulgação)
- Feri pessoas que jamais pensei em ferir por descuido meu; minha mãe,
irmãs, pessoas que estavam ao meu redor e queriam meu bem. Foi algo muito
triste, pois minha mãe estava me ajudando muito, apostando em mim e
infelizmente isso aconteceu. Eu estava roubando motos em Roraima. Na última vez
que fui preso eu apanhei muito da polícia. Peguei tiro de bala de borracha e
foi o tempo que minha mãe mais sofreu, e isso estava também me deixando triste.
Eu sabia que aquilo ali não estava certo. Fazia em busca de adrenalina, não
por que precisava de dinheiro para sobreviver. Fazia por que andava com as amizades
erradas, isso me complicou - disse.
Segundo Santos, o envolvimento com o crime já estava chegando numa
encruzilhada. Ele tinha que optar, e tinha que ser o mais rápido possível.
- A polícia já não queria mais saber. Tudo que acontecia no bairro a culpa
era jogada para cima de mim, tudo que sumia no bairro eles [polícia] iam logo atrás
de mim. Quando sumia moto eles iam na minha casa me procurar, era algo tenso.
Foi então que disse para minha mãe que eu iria mudar de vida. Ela perguntou
como eu iria mudar de vida se quase todo dia eu era preso, eu falei pra ela que
iria morar em Manaus, que iria embora. Ela disse que lá seria pior,
por ser cidade grande.
Na conquista do 1º lugar do Campeonato Brasileiro de Jiu-jítsu da CBJJE (Foto: Divulgação)
O fundo do poço: 'vou mudar de vida'
Santos lembra que certa vez um policial lhe disse que era a quinta vez que estava
sendo preso em apenas três meses, e se fosse preso mais uma vez eles dariam um
'jeito' no lutador.
- Minha mãe entrou em desespero. Foi então que prometi para ela assim
que sai da delegacia, que não mais choraria de tristeza e se um dia chorasse
seria de orgulho, foi então que fui para Manaus e dei um passo bem melhor na
minha vida. Procurei um trabalho de garçom e lá voltei a treinar jiu-jítsu. Daí
em diante as coisas deram certo na minha vida.
Foi mais ou menos ai que o jiu-jítsu mudou sua história. A mudança de vida
foi completa. O campeão também na vida resolveu apagar suas amizades 'erradas'
tanto no mundo real quanto no virtual.
Santos ao vencer o Campeonato Mundial de Jiu-jítsu Esportivo (Foto: Divulgação)
- Exclui muita gente das redes sociais. Muita gente pensa que eu ainda estou
preso, saí de Roraima e fui treinar em Manaus há uns cinco anos, sumi da vista dos 'maus amigos'.
Seu
envolvimento com o lado 'errado' da vida cobrou um preço alto. Santos
tinha que sair de Boa Vista. Ele mudou, graças ao esporte.
-
Agradeço a Deus pelas maravilhas, pois hoje vejo que Ele me fez reviver e
me deu uma nova vida. Quando me tirou de perto de quem eu mais amo, que é
minha mãe, era pra me dar algo, que me fizesse aprender
a ver o mundo de perto. Me tirou daquela escuridão, daquela vida que
talvez se
tivesse ficado lá hoje poderia estar completando 4 anos que estaria
morto ou
preso. Mas não, Ele me deu uma nova chance de recomeçar e me mostrou que
o jiu-jítsu
tem poder de transformar vidas.
O
alvorecer; 'o jiu-jítsu mudou minha vida'
A transformação para o mundo esportivo foi pesada. O aquariano que adotou o
jiu-jítsu como profissão e estilo de vida, tinha que deixar a infância e
juventude conturbada para trás.
Um ponto a favor do atleta foi sua forma competitiva de ver a vida. Chegou
em Manaus com 15 anos e lá passou um bom tempo.
- O jiu-jítsu veio e com ele treinos, treinos e mais treinos. Os resultados
aparecendo, conquistas, medalhas, continuei tentando correr atrás de um sonho
onde poucos conseguem chegar, que é viver de jiu-jítsu. O problema é que é ralado
viver longe da família, quando você adoece não tem aquele colo de mãe pra
cuidar de você. Enfim a vida me ensinou a crescer de verdade mais não com
aquele amor e carinho que minha mãe queria me ensinar - revela.
Equipe de treino de Erberth Santos liderada pelo professor Guigo (Foto: Divulgação)
Fé, família e foco: do Rio de Janeiro
aos Estados Unidos
O tempo veio e o lutador já não era mais aquele 'curumim', agora estava com 18 anos. De Manaus foi morar no Rio De Janeiro. Segundo ele mesmo disse, lá treinou mais do que já treinava, se destacou em cima de muitos atletas conhecidos no Brasil e no mundo. Com isso realizou um sonho, que foi lutar o Mundial dos Estados Unidos.
O tempo veio e o lutador já não era mais aquele 'curumim', agora estava com 18 anos. De Manaus foi morar no Rio De Janeiro. Segundo ele mesmo disse, lá treinou mais do que já treinava, se destacou em cima de muitos atletas conhecidos no Brasil e no mundo. Com isso realizou um sonho, que foi lutar o Mundial dos Estados Unidos.
- A partir daí percebi o quanto minha vida tinha mudado com o jiu-jítsu.
Portas se abriram, resultados todos aparecendo, comecei a fazer meu nome, estava
ficando conhecido. Então assim as coisas se encaminharam.
Hoje aos 19 anos, depois das barreiras e dificuldades que ficaram pra trás,
recentemente recebeu proposta de ir para São Paulo, e agora para os Estados
Unidos.
- Acreditei nos meus sonhos e tentei realizá-los, o
jiu-jítsu mudou minha vida. Na última vez que estive em Roraima fui
visitar minha mãe, e aproveitei para lutar o
Campeonato Roraimense Sem Kimono, no dia 15 de dezembro. Queria mostrar
para
todos que realmente eu mudei de vida.
Em dezembro de 2013 o lutador participou do Campeonato de Jiu-jítsu Sem Kimono, em Roraima (Foto: Divulgação)
Atualmente Erberth é aluno do professor Guigo, é faixa marron, e um dos
mais novos na faixa na atualidade. Seu grande sonho é ser campeão mundial na
faixa preta, após irá treinar também MMA.
Na terça-feira (28)
embarcou de São Paulo rumo aos Estados Unidos, onde treinará em
Washington, na academia do professor Lloyd Inver.
Sonho em realidade, Erberth Santos (kimono preto) agora treina nos Estados Unidos, com Lloyd Irvin (Foto: divulgação)
- Ainda não caiu a ficha, só vou acreditar quando chegar lá. Saí de uma
condição humilde. Sou filho de pobre e estar indo para morar no exterior é algo muito
gratificante. Quero chegar e treinar muito lá, mostrar o potencial do Brasil, de
Roraima. Disputar os grandes campeonatos, como o Naga [The North
American Grappling Association], vou com muita vontade de ganhar, vou chegar
com um ritmo bom.
Todos os prognósticos eram desfavoráveis. Vindo de uma família pobre e sob certa
influência de 'amigos' que o induziram ao crime, conseguiu a tempo firmar as
mãos no leme de sua vida. Vestiu o kimono da força de vontade, amarrou a faixa
da sabedoria e treinou no tatame que vale a pena lutar, o da busca pelos
sonhos. Erberth, um gigante.
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